sexta-feira, 1 de junho de 2012

* FIM DE UMA HISTÓRIA DE AMOR


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                                                         Welington Almeida Pinto

 

Suzana em tom irritado:
- Não suporto mais o seu amigo, Math. É o demônio em si.
- Putz!
- Quer saber, meu casamento foi um engodo.
- Engodo?!...
- Por que o espanto?
- Escute aqui, criatura, discussões são inevitáveis. Todo casamento tem altos e baixos..., tem lá suas briguinhas, batalha de egos. Logo passa e tudo volta como antes, vai por mim.
- Passa não. Chega!
- Dê tempo ao tempo. Nada como o tempo para aparar arestas, rusgas entre marido e mulher - afiança Mathieu numa voz serena.
- Ora, Math, nada melhor do que tempo para tornar um relacionamento amoroso cada vez mais insuportável!...
- Também.
Suzana enrijece as faces, baixa os olhos:
- Vou me separar do José Renato, não vejo outra saída.
- Pegadinha, ‘né?
- Não é não, resolvi terminar tudo de uma vez. Poxa, nada mais encaixa entre a gente!
- Nada?
- Nada. Há alguns anos nosso casamento anda por um fio, cambaleando em corda bamba.  Agora, degringolou de vez.
Mathieu muda de posição na poltrona e, de um gole, toma o resto de cerveja no copo.
- Mulher, escuta. Olhe que o Zé...
- Não quero saber mais dele. Passou da hora de tirar meu time de campo.
- Loucura de sua parte.
- Não vejo outra saída. Acabou.
- Ô, querida, viver a dois é um exercício de paciência. Tenta manter a calma, tudo se revolve.
- Resolve nada, dura além da conta. Estou sem chão dentro de minha própria casa, que fede que nem o inferno. Você não sabe. Você não tem ideia. Um nojo!...
- Difícil de acreditar no que está dizendo - solta Mathieu, deixando transparecer seu espanto.
- Não suporto mais representar diante de todos. Chegou a hora de dar um basta nessa maluquice de querer provar o meu valor a quem não merece. A ficha caiu. Agora, vou cuidar de mim.
- Caracas!
- Pena que descobri isso tão tarde. Ai, que ódio!...
- Lamento.
- Perdi bom tempo de minha vida na busca do reconhecimento de um esposo egocêntrica, grosso, insensível...
- Compreendo.
- Na verdade, Math, se não pudermos mudar as pessoas, temos que mudar a maneira de lidar com elas. Mais fácil assim.
- Talvez.
- É sim.
- Então não tem jeito, quer mesmo se separar de seu marido?
Com a expressão franzida, Suzana:
- Sim, sim. Vivo o próprio pesadelo de Kafka, abotoada por dentro e por fora, num beco sem saída. Tudo na memória, retratando. Não dá mais para segurar essa barra, tudo tem limites, não é mesmo?
- Caracas!...
- Há muito meu casamento agoniza na UTI.
O rapaz balança a cabeça, apaga a ponta do cigarro no cinzeiro sobre a mesinha no centro da sala de visitas e, num gesto de otimismo, pondera:
- Ainda torço para que sejam briguinhas domésticas. A chama do amor vai logo reacender, pode crer.
- Não se faça de ingênuo. Dessa vez é sério, quadro irreversível.
- Sem volta mesmo?
- Missão cumprida. Não tenho um átimo de dúvidas sobre o meu futuro de mulher separada.
- É.
- Na verdade, gostaria de estar apaixonada e feliz. Seu amigo não entendeu e interrompeu a saúde de nossa união. Portanto...
- É.
Pausa. Depois de refletir por um minuto, Suzana em tom filosofal:
- Culpada é a vida que respira entre o prazer e a angústia, entre a tristeza e a alegria, o ser e o não ser.  Que respira entre o amar e o não amar, entre a diferença do claro e do escuro... Incompatibilidades inconciliáveis entre coração e razão. Capiche?
- Entendo. Entendo.
- Ainda bem.
- Mude, mas comece devagar porque a direção é mais importante que a velocidade. Ensina Clarice Linspector.
- Claro, claro.
Madrugada sem ruído nenhum na Avenida Afonso Pena. Apenas o sibilo do vento fresco que invadia a sala pela janela, acariciando as flores e as folhas nos vasos.
 
 
FBN© - 2013 – FIM DE UMA HISTÓRIA DE AMOR - trecho recontextualizado capítulo  5º/V (‘Vidas Amargas’) do livro ‘Numa Noite em 68’ - Categoria: Conto/Realismo Mágico. Autor: Welington Almeida Pinto. Texto original em Portugês: http://www.wattpad.com/20727810-fim-de-uma-de-uma-hist%C3%B3ria-de-amor - Ilustr.: foto da Internet – Link.: http://fantasticorealismo.blogspot.com.br/2012/06/blog-post_1526.html

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